São Paulo – O ex-presidente do Banco Central do Brasil, Roberto Campos Neto, afirmou em artigo publicado na Folha de S.Paulo que o endividamento dos governos chegou a um patamar “claramente insustentável” e exige a revisão de modelos de gasto público em todo o mundo.
Segundo o economista, a resposta fiscal e monetária coordenada à Covid-19 fez a dívida global crescer cerca de 15 pontos percentuais do Produto Interno Bruto (PIB) desde 2019. Nas economias emergentes, o salto foi ainda maior, de 20 p.p.
Campos Neto lembra que 65% de todo o passivo soberano está concentrado em Japão, Estados Unidos e Europa, regiões que hoje pagam custos de rolagem bem mais altos em razão do aumento simultâneo do estoque de débitos e das taxas de juros. Esse movimento, diz ele, “drena recursos” de países emergentes e pobres.
O ex-BC ressalta que as transferências de renda cresceram globalmente entre 1,5 e 2 p.p. do PIB durante a crise sanitária e continuam acima do nível pré-pandemia. A regra dos “3 Ts” — benefícios temporários, direcionados (targeted) e sob medida (tailored) —, discutida entre bancos centrais no FMI, não foi seguida, afirma.
Dados do Fundo Monetário Internacional citados por Campos Neto mostram déficit primário médio de 2% do PIB nas economias avançadas e de 3,8% nos emergentes. Para ele, a maioria dos ajustes adotados até agora privilegia o aumento de receita, com novos tributos sobre estoques de riqueza e empresas, o que pode reduzir a produtividade no longo prazo.
O artigo menciona ainda o envelhecimento populacional, que eleva gastos previdenciários e reduz a força de trabalho, além de instabilidade geopolítica e alto custo da transição energética. Todos esses fatores, argumenta, requerem investimentos substanciais.
Imagem: redir.folha.com.br
O Fundo prevê que a relação dívida/PIB global suba de 84% em 2019 para 100% em 2030. Campos Neto relaciona o cenário a juros mais elevados, aumento da desigualdade e despesas crescentes com defesa, reorganização de cadeias de suprimentos e programas sociais.
Entre os pontos de atenção, ele cita os efeitos do “trumpenomics” nos Estados Unidos, a vulnerabilidade de países pobres, a necessidade de um novo modelo econômico para a Europa, a trajetória da dívida japonesa em ambiente de juros longos maiores e o avanço da China em setores estratégicos.
Campos Neto considera que o orçamento recentemente aprovado nos EUA sinaliza o início de uma nova fase de tensão fiscal e aconselha economias emergentes, como o Brasil, a adotarem políticas de ajuste e se prepararem para maior volatilidade.
Com informações de Folha de S.Paulo