São Paulo – As tarifas anunciadas pelo ex-presidente norte-americano Donald Trump para chips e semicondutores criaram brechas que beneficiam fornecedores chineses, afirmou Brian McCarthy, fundador da consultoria Macrolens especializada em mercado chinês.
Segundo o analista, a medida incluiu isenção para empresas que se comprometam a investir nos Estados Unidos. A Apple, que concentra 33% de seus fornecedores na China, anunciou aporte de US$ 100 bilhões e, com isso, escapou da sobretaxa.
Washington conduz investigação sobre o setor e estuda aplicar tarifas de quase 100% a componentes eletrônicos. Caso confirmadas, as alíquotas podem atingir cadeias de produção de automóveis, smartphones e computadores.
“A declaração de Trump abriu caminho para que a China drible a taxação”, disse McCarthy. Hoje, produtos chineses pagam tarifa total de 20% — 10% foram eliminados e outros 10% decorrem das sanções ligadas ao tráfico de fentanil. Já a Índia sofre incidência de 25%, patamar que pode dobrar para 50% em três semanas se Nova Délhi mantiver a compra de petróleo russo.
Com a escalada da guerra comercial, a Apple vinha transferindo parte da produção para território indiano. Projeção do Goldman Sachs indica que, no terceiro trimestre, a maior parte dos iPhones vendidos nos EUA sairá de fábricas indianas; o restante continuará vindo da China. A companhia estima prejuízo de US$ 900 milhões no período por causa das tarifas.
Para McCarthy, o movimento de longo prazo segue válido, pois a disputa tecnológica dos EUA mira principalmente Pequim. “Um acordo com a Índia tende a ser resolvido em breve, mas persistem riscos ligados ao regime chinês”, avaliou.
Thomas Monteiro, analista-chefe da Investing.com, observa falta de critérios claros para concessão de isenções. “Não se sabe se basta prometer investimento, executar aporte ou atingir certo valor”, afirmou.
Imagem: redir.folha.com.br
Grandes fabricantes já informaram estar livres das novas tarifas. A taiwanesa TSMC, responsável por 67% dos chips globais, prometeu investir US$ 165 milhões nos EUA. A Samsung mantém fábrica em Austin (Texas), e a compatriota SK Hynix declara aplicar “bilhões de dólares” no país.
Empresas de Japão, Singapura, Malásia e Europa que não possuem unidades nos Estados Unidos podem ficar expostas. “Companhias que atuam em nichos específicos, menos estratégicos, têm menor poder de barganha para levar produção aos EUA”, disse Monteiro.
Por pressão do governo Trump, a Apple deve substituir a japonesa Sony pela sul-coreana Samsung no fornecimento de sensores de câmera para o iPhone 18, previsto para o fim do ano. A notícia impulsionou as ações da TSMC, que subiram 4,32% na quinta-feira (7).
A estratégia de Trump busca atrair parte da cadeia de valor para solo americano em meio à disputa por liderança em inteligência artificial e computação avançada. Especialistas, porém, lembram a forte concentração de etapas críticas fora dos EUA – a holandesa ASML produz entre 80% e 90% das máquinas de fotolitografia usadas na fabricação de chips e não possui fábricas americanas.
Para Monteiro, o governo prioriza controle estratégico mesmo diante do aumento de custos. “Produzir internamente encarece a operação, mas dominar a tecnologia é considerado essencial”, concluiu.