A exigência do exame criminológico para qualquer pedido de progressão de regime, estabelecida pela Lei 14.843, em vigor desde o início de 2024, expôs a falta de profissionais de saúde no sistema prisional brasileiro. Antes da mudança, o laudo só era solicitado quando o juiz considerava necessário.
Leandro Lanzellotti, presidente do Conselho Penitenciário de São Paulo, explica que o exame consiste em um parecer técnico elaborado por psicólogos e, em casos mais complexos, por psiquiatras. “Agora temos uma demanda muito maior por laudos, e as equipes de saúde da secretaria já eram bastante requisitadas”, afirma.
Levantamento da organização República.org, com dados do Sistema Nacional de Informações Penais (Sisdepen), aponta que os presídios estaduais contam com 1.416 médicos para uma população superior a 670 mil presos. Os números foram apresentados nesta sexta-feira (1º) durante a Flip, em Paraty (RJ).
A média nacional é de 473 detentos por médico, com desvio-padrão de 221, indicando grande variação entre os estados. São Paulo concentra 30% dos presos do país, mas apenas 12% dos médicos: são 1.190 internos para cada profissional. No Maranhão, a relação cai para 152 presos por médico.
Para Ana Paula Sales, analista de dados da República.org, o problema não se limita à assistência clínica. “Falta acesso a atendimento psicológico, crucial para a reinserção social”, diz.
Um médico que atende há mais de 12 anos em uma grande penitenciária paulista relata ser o único profissional disponível. Segundo ele, as três unidades prisionais mais próximas, também de grande porte, não contam com médicos fixos. O receio de trabalhar em presídios, avalia, afasta colegas da função, mesmo que situações de intimidação sejam raras. “Os internos entendem que estamos lá para ajudar”, afirma.
O profissional trata os custodiados como pacientes e evita questionar o motivo da condenação. Já agentes penitenciários, observa, falam abertamente sobre os crimes.
Imagem: redir.folha.com.br
Em nota, a Secretaria da Administração Penitenciária de São Paulo (SAP) informa que todos os internos passam por triagem de saúde e recebem atendimento médico e odontológico presencial ou por telemedicina, conforme a necessidade. As unidades, acrescenta, dispõem de equipes básicas em parceria com os municípios, e a medicação é fornecida mediante prescrição.
Antônio Pereira Ramos, presidente do Sindpenal (Sindicato dos Policiais Penais de São Paulo), confirma as parcerias com o SUS, mas ressalta o custo operacional de levar presos a consultas externas: “É preciso viatura, autorização da direção e grande burocracia, enquanto a função principal do policial penal deveria ser a segurança”.
Segundo a SAP, as enfermidades que requerem maior atenção na rede prisional paulista são tuberculose, HIV, sífilis e hepatites. Dados do Sisdepen também destacam a hanseníase entre as doenças infecciosas e registraram mais de 35 mil casos no país em 2023.
Com a obrigatoriedade do exame criminológico e a carência de profissionais, estados buscam alternativas para cumprir a lei sem agravar a sobrecarga já existente nos serviços de saúde das unidades prisionais.
Com informações de Folha de S.Paulo