Brasília – A Medida Provisória 1.307/25, assinada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 18 de agosto, impõe que empresas localizadas em Zonas de Processamento de Exportação (ZPEs) utilizem exclusivamente energia renovável proveniente de novas usinas. A decisão, celebrada pelo Planalto como incentivo à instalação de data centers no país, passou a ser chamada no mercado de “MP dos data centers” e “MP Mário Araripe”, em alusão ao fundador da Casa dos Ventos, maior geradora de energia eólica do Brasil.
A Casa dos Ventos mantém uma carteira de projetos de geração renovável pronta para contratação, tem conexão assegurada pelo Operador Nacional do Sistema (ONS) e relações adiantadas com governos estaduais. Com essas vantagens, a companhia pode firmar acordos imediatamente, mesmo que a MP não seja convertida em lei dentro do prazo máximo de 120 dias.
O grupo prepara um investimento estimado em R$ 50 bilhões para erguer um data center na ZPE de Pecém (CE), destinado a atender a ByteDance, controladora do TikTok. O contrato ainda não foi assinado, mas prevê fornecimento de energia eólica e solar. Segundo a empresa, o complexo consumirá quantidade de eletricidade equivalente à de uma cidade com 2,8 milhões de habitantes.
Empresas em ZPEs já são isentas de tributos federais sobre consumo, desde que exportem toda a produção. A MP mantém o benefício e estende a possibilidade de prestação de serviços entre companhias instaladas nessas zonas — um pleito da ByteDance, pois sistemas de resfriamento de data centers são enquadrados como serviços.
“Qualquer compra feita por uma empresa de dentro da ZPE a fornecedores externos é tratada como exportação, sem incidência de impostos federais sobre consumo nem ICMS; somente Imposto de Renda”, explica Helson Braga, presidente da Associação Brasileira de Zonas de Processamento de Exportação (Abrazpe).
Parte do setor vê a medida como limitadora. Alberto Leite, fundador do Grupo FS, avalia que o texto “trava escala, velocidade e previsibilidade” necessárias para atrair data centers. Empresas de gás natural, como a Energisa, divulgaram estudos defendendo a diversificação da matriz energética para instalações do tipo. A Siemens Energy, fornecedora de equipamentos para termelétricas, também manifestou preocupação.
Especialistas ouvidos sob condição de anonimato alegam que, devido à intermitência de fontes eólica e solar, data centers podem precisar recorrer à geração térmica em períodos de menor oferta renovável, sobretudo em épocas de seca.
Imagem: redir.folha.com.br
Gestores de outras ZPEs igualmente se queixam. “Não faz sentido impor a mesma restrição a indústrias que necessitam de liberdade para escolher a matriz energética”, afirma Braga, da Abrazpe, que defende revisão do texto.
Lula anunciou a MP durante visita ao Ceará, enfatizando pedidos do governador Elmano de Freitas e do ministro da Educação, Camilo Santana, ambos cearenses. Nos bastidores, agentes do mercado avaliam que a exigência de energia renovável pode favorecer empresas chinesas, cujos projetos priorizam essas fontes, em detrimento de gigantes norte-americanas que têm optado por termelétricas a gás natural.
O governo federal não se pronunciou sobre as críticas até a publicação desta reportagem. O arcabouço legal definitivo para data centers segue em elaboração no Congresso.
Com informações de Folha de S.Paulo