Depois de dois anos de forte captação, os fundos de debêntures incentivadas atravessam o primeiro período de desgaste. A abertura dos spreads no mercado secundário, agravada pela ameaça de tributação prevista na Medida Provisória 1.303, derrubou a performance das carteiras e desencadeou resgates expressivos.
Levantamento da Sparta Investimentos, com dados da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), mostra que o setor registrou saídas líquidas de R$ 2 bilhões entre 1.º e 8 de dezembro de 2025. Até o fim de novembro, a indústria acumulava captação positiva de R$ 94 bilhões, mas virou para terreno negativo nos últimos dias do mês. Segundo a Anbima, o patrimônio sob gestão é de aproximadamente R$ 200 bilhões.
Em outubro, a diferença entre a remuneração exigida pelo mercado e a paga pelos títulos públicos se ampliou, penalizando as cotas. Durante a corrida pela manutenção da isenção fiscal, em meados daquele mês, debêntures incentivadas chegaram a ser negociadas com rendimento 0,75 ponto percentual inferior ao das NTN-Bs. Menos de quinze dias depois, o spread abriu 0,50 ponto, estabilizando-se cerca de 0,25 ponto abaixo das NTN-Bs.
Com a caducidade da MP, o estímulo para manter papéis com spreads comprimidos desapareceu, provocando vendas generalizadas e a consequente queda das cotas. Quase nenhum fundo superou o CDI em outubro e vários registraram rentabilidade negativa; novembro e dezembro caminham para repetir o desempenho fraco.
Gestores avaliam que, considerando as taxas atualmente em carteira e as despesas de administração, a indústria entregará algo próximo de 80% do CDI em 2026. Se houver nova abertura de spreads, o retorno pode cair para cerca de 60% do índice de referência.
O cenário deve continuar pressionando o fluxo de recursos. Como os prazos de cotização e liquidação variam de um a 60 dias, os pedidos de resgate feitos recentemente ainda serão refletidos nas estatísticas dos próximos meses. Janeiro, tradicionalmente marcado por saídas ligadas a férias e pagamento de 13.º salário, tende a intensificar o movimento.
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O volume de ofertas primárias costuma diminuir entre o fim e o início do ano, o que pode evitar uma deterioração adicional dos spreads, já que fundos com necessidade de alocação recorreriam ao mercado secundário. Além disso, veículos lançados há menos de dois anos precisam manter 67% do patrimônio em debêntures incentivadas depois de seis meses de operação e 85% após 24 meses, obrigando parte da indústria a comprar títulos no primeiro trimestre de 2026.
Para lidar com a nova realidade, gestoras vêm reduzindo a duração média das carteiras e aumentando a originação própria de créditos, em busca de prêmios acima dos praticados no mercado.
Outro foco é a eventual migração para fundos indexados à inflação. Caso a Selic continue caindo e as NTN-Bs, hoje em torno de IPCA + 7,50%, avancem, produtos atrelados ao índice de preços podem superar os vinculados ao CDI, atraindo investidores ao longo dos próximos seis a 12 meses.
Por ora, porém, o principal desafio permanece: conter os resgates e tentar preservar rentabilidade em um ambiente de spreads ainda apertados.