Demanda por ouro avança na China, mas imóveis e tecnologia continuam no radar

A busca chinesa por proteção em ouro se intensificou em 2025, abrangendo o Banco do Povo da China (PBoC), gestoras de recursos e famílias, com reflexo direto em robustos aportes nos fundos negociados em bolsa (ETFs) do metal. Especialistas ouvidos pelo Broadcast, contudo, afirmam que o foco dos poupadores segue dividido: muitos ainda guardam recursos para adquirir imóveis, enquanto as autoridades aceleram estímulos voltados ao setor de tecnologia.

O que explica o movimento

Kelvin Lam, economista sênior para China na Pantheon Macroeconomics, avalia que a formação de poupança no país vai além da crise imobiliária iniciada em 2021. Mesmo após a forte correção, ele sustenta que o mercado de moradias permanece em condição melhor do que no começo da década e ressalta que jovens chineses continuam reservando dinheiro para comprar casas como forma de acumular patrimônio. Segundo Lam, depois de uma recuperação frustrada prevista para 2025, o segmento habitacional pode retomar força em 18 a 24 meses.

Lam relaciona a procura por ativos considerados seguros, como o ouro, a um ambiente de baixa confiança do consumidor e de incertezas geopolíticas. Ele lembra que bancos centrais de outros países, como Japão e Suíça, também vêm ampliando reservas desde meados de 2016.

Participação das famílias e arbitragem

Torsten Slok, economista-chefe da Apollo Global Management, aponta a China como peça-chave para a trajetória dos preços do ouro em 2025. Em boletim a clientes, ele afirma que o impulso não se limita às compras do PBoC; operações de arbitragem e aquisições por famílias chinesas também sustentam a demanda. Na visão de Slok, receios com queda no valor das residências, deflação e desvalorização do yuan motivam os consumidores a migrarem parte da poupança para o metal.

Números do Conselho Mundial do Ouro

Dados do World Gold Council (WGC) indicam que o Banco do Povo da China adquiriu ouro pelo décimo terceiro mês seguido em novembro, elevando as reservas para 2,3 toneladas, ou 8,3% do total de ativos internacionais do país.

No mercado financeiro, os ETFs listados em Xangai registraram entradas de 16 trilhões de yuans (aproximadamente US$ 2,2 bilhões), o equivalente a 17 toneladas de ouro, mesmo com a cotação em alta. Por outro lado, a valorização do metal reduziu em 32% a demanda no atacado — categoria que abrange fabricantes de joias — na comparação mensal.

Outro relatório do WGC coloca o banco central chinês como o quinto maior comprador de ouro no terceiro trimestre de 2025, atrás de Casaquistão, Turquia, Brasil e Guatemala.

Imagem: Matt Jelonek via infomoney.com.br

Projeções para os preços

O JPMorgan projeta que a demanda chinesa será um dos principais sustentáculos para elevar a cotação do ouro a US$ 5.000 por onça-troy até o fim de 2026. Em sentido oposto, a Capital Economics prevê um rali temporário, seguido por recuo para cerca de US$ 3.500.

Estratégia de Pequim para tecnologia

Enquanto o metal ganha espaço como reserva de valor, o governo chinês intensifica medidas para estimular o consumo interno e transferir o motor de crescimento para setores ligados à tecnologia e à inteligência artificial. De acordo com Kelvin Lam, a elevada taxa de poupança também reflete preocupações estruturais: cobertura limitada de seguro-saúde e incertezas no mercado de trabalho.

Lynn Song, economista-chefe para a China continental no ING, destaca que a eficácia dos pacotes de estímulo e a forma como Pequim lidará com o fim da trégua tarifária ao final do quarto trimestre de 2026 serão determinantes para o cumprimento das metas de longo prazo, que incluem a liderança tecnológica. O banco holandês projeta expansão de 5% do PIB chinês em 2025, desacelerando para 4,6% em 2026.

Assim, embora o ouro se consolide como alternativa defensiva, o apetite por imóveis e a aposta oficial em tecnologia permanecem no centro das estratégias de crescimento e de preservação de riqueza na segunda maior economia do planeta.