Brecha criada pelo BC em 2021 facilita cobrança indevida de aposentados via débito automático

Mercado Financeiro36 minutos atrás6 pontos de vista

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Uma alteração nas regras de débito automático implementada pelo Banco Central em 2021 permitiu que empresas financeiras vinculadas a seguradoras e clubes de benefícios realizassem milhares de cobranças sem autorização nas contas de aposentados do INSS.

O que mudou

Até 2021, os bancos só podiam inscrever um débito automático após consentimento do cliente. A partir da resolução 4.790, assinada na gestão de Roberto Campos Neto, essa exigência deixou de valer quando a ordem de cobrança parte de outra instituição financeira autorizada pelo BC.

A justificativa oficial era reduzir fraudes, mas a medida acabou enfraquecendo o processo de checagem e abriu caminho para débitos em massa, principalmente contra idosos de baixa renda e baixa escolaridade que vivem no interior do país.

Como funciona o esquema

Investigação mostra que uma seguradora e dois clubes de benefícios passaram a usar financeiras de pequeno porte, controladas pelos mesmos grupos, para enviar as ordens de débito. Quando esses pedidos chegam ao banco, na maioria dos casos não há verificação com o correntista.

Os bancos cobram das financeiras até R$ 11 por transação. Se uma financeira debita R$ 50 mensais de 100 mil aposentados, pode movimentar R$ 60 milhões por ano, dos quais até R$ 13,2 milhões ficam com o banco em tarifas.

Grupos identificados

Aspecir: usa a financeira Aspecir para debitar valores destinados à União Seguradora, que pertence aos mesmos sócios.

Eagle: emprega a financeira Eagle para descontar valores da Verbin Seguros, também conhecida como Clube Conectar, administrada por sócios da própria financeira.

Sudacred: realiza débitos para o clube de benefícios Sudaclube; o Tribunal de Justiça de São Paulo aponta que operam no mesmo grupo econômico.

Explosão de processos

Levantamento da plataforma Escavador aponta 67 mil ações contra esses três grupos na última década. O salto coincidiu com a mudança regulatória: de 1.400 processos em 2020 para 31.700 em 2024—crescimento superior a 20 vezes.

Em setembro de 2023, Sudacred e Sudaclube foram condenadas a pagar R$ 1,5 milhão por danos morais coletivos em Santa Fé do Sul (SP). Segundo o Conselho Nacional de Justiça, as empresas respondem em 25 das 27 unidades federativas.

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Imagem: redir.folha.com.br

Resultados financeiros suspeitos

A arrecadação da União Seguradora subiu de R$ 50 milhões em 2021 para R$ 198 milhões em 2024, enquanto o pagamento de sinistros caiu de R$ 31 milhões para R$ 13 milhões. Em 11 estados, que concentraram um quarto das receitas de 2024, não foi registrado nenhum sinistro pago.

Postura dos bancos

Dos sete bancos com mais contas de beneficiários do INSS, o Bradesco é o mais acionado na Justiça: responde por 80% dos casos em que instituições financeiras são citadas junto com os grupos acima. Em seguida aparecem Itaú, Caixa, Banco do Brasil e Santander.

Mercantil e Bancoob não tiveram processos identificados. O Mercantil afirma manter a exigência de autorização prévia, mesmo após a mudança do BC. O Bancoob diz não ter convênio de débito automático com as empresas investigadas.

A Febraban alega que a norma impede os bancos de solicitar autorização do correntista quando a cobrança vem de outra financeira. O Banco Central, porém, informou em nota que as instituições “não estão proibidas” de adotar controles adicionais.

Reações oficiais

Questionado sobre fiscalização, o BC declarou que não comenta ações de supervisão específicas. Os bancos afirmam notificar clientes sobre novos débitos e oferecer cancelamento. Especialistas em finanças criticam o monitoramento bancário e sustentam que, diante das reclamações, os convênios com as financeiras deveriam ter sido suspensos.

Nas ações judiciais, bancos costumam alegar que são apenas intermediários de pagamento, mas a Justiça frequentemente os condena a restituir valores e pagar indenização com base em súmula do Superior Tribunal de Justiça que responsabiliza instituições financeiras por fraudes em operações bancárias.

As empresas Aspecir e União Seguradora não responderam aos contatos desde 10 de julho. Eagle e Verbin Seguros dizem não vender diretamente os produtos cobrados dos aposentados. Sudacred e Sudaclube afirmam que suas vendas têm origem legítima e que há confirmação de aceite pelos clientes.

A alteração regulatória segue em vigor.

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