As indústrias de moagem no Brasil devem ampliar ainda mais as aquisições de trigo da Argentina depois que o governo de Javier Milei eliminou, nesta semana, a alíquota de 9,5% sobre as exportações de grãos e derivados. A medida, temporária, reforça a pressão sobre as cotações recebidas pelos produtores brasileiros, afirmam especialistas do setor.
De janeiro a agosto de 2025, o Brasil importou 3,66 milhões de toneladas de trigo argentino, volume 24% superior ao do mesmo período de 2024 e o maior para o intervalo desde 2021. No total, as compras externas somaram 4,68 milhões de toneladas, segundo dados oficiais brasileiros, confirmando a Argentina como principal fornecedor.
Com a isenção, a expectativa é de substituição de origens alternativas pelo trigo argentino, considerado o mais competitivo no mercado internacional. “Os preços já vinham girando em torno da paridade de importação; a tendência é de maior pressão”, avaliou Flávio Turra, gerente técnico-econômico da Organização das Cooperativas do Paraná (Ocepar), segundo maior estado produtor do cereal.
No Paraná, o indicador do Cepea aponta recuo superior a 9% no mês, para R$ 1.275 por tonelada. Carlos Hugo Godinho, analista do Departamento de Economia Rural (Deral), atribui a queda à combinação de boa oferta global, valorização do real frente ao dólar e safra volumosa na Argentina. “O imposto zerado adiciona outro fator de baixa”, disse.
Rubens Barbosa, presidente-executivo da Associação Brasileira da Indústria do Trigo (Abitrigo), confirmou que o cereal argentino é atualmente o mais barato e observou aumento nas compras brasileiras nos últimos meses. Um comprador de um grande moinho em São Paulo relatou, sob anonimato, queda de US$ 2 a US$ 3 por tonelada na Argentina desde o anúncio. “Quem precisa está fechando negócio, mas há cautela porque o preço pode ceder ainda mais”, comentou.
Imagem: Reuters via moneytimes.com.br
O Paraná colheu 41% da área cultivada até o momento. Apesar de a superfície plantada ter diminuído cerca de 25% em 2025, Turra destaca potencial produtivo elevado graças ao clima favorável. Ainda assim, Godinho admite que a concorrência acirrada com o cereal argentino deve afetar a rentabilidade da safra nacional.
Produtores reduziram a área de trigo neste ano após perdas causadas por condições climáticas adversas e pela falta de estímulo nos preços. Com a cotação interna sob nova pressão, o setor teme impactos adicionais durante a etapa de comercialização.