Brasília – Documentos do Conselho Nacional da Previdência Social (CNPS) revelam que as primeiras queixas sobre descontos irregulares de empréstimos consignados em aposentadorias e pensões do INSS foram registradas ainda em 2005, apenas dois anos após a criação dessa modalidade de crédito.
Na 115ª reunião ordinária do colegiado, realizada em outubro de 2005, a Ouvidoria do então Ministério da Previdência apresentou dados que mostravam crescimento nas reclamações de beneficiários que não haviam autorizado a contratação de empréstimos, mas mesmo assim sofriam descontos. Entre julho de 2004 e setembro de 2005, essas ocorrências representaram 15,7% de todas as queixas recebidas pelo órgão.
Segundo técnicos do INSS ouvidos pela reportagem, o problema está na origem do consignado, que utiliza aposentadorias e pensões como garantia do pagamento das parcelas.
O representante do INSS na reunião de 2005 era Benedito Brunca, hoje secretário do Regime Geral de Previdência Social. Naquele encontro, ele apresentou as regras iniciais — prazo máximo de 36 meses para quitação e proibição de contratação por telefone. Inicialmente, apenas instituições pagadoras de benefícios podiam firmar convênios; depois, qualquer banco passou a operar, e o BMG se tornou o principal agente na época.
Brunca não respondeu aos pedidos de entrevista sobre o conteúdo da ata.
Nelson Machado, titular da Previdência em 2005, disse que o desconto de mensalidades associativas — foco da CPI instalada neste ano — é diferente do crédito consignado, embora reconheça problemas na fase de implantação. Ele afirmou que o INSS levou o debate ao sistema bancário e que a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) passou a atuar em conjunto com os Procons.
Em junho de 2010, Evandro José Morello, da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), manifestou preocupação com possíveis fraudes após a detecção de 145 documentos falsificados para concessão de empréstimos. A entidade, atualmente alvo de investigação sobre descontos associativos, afirma seguir critérios de legalidade e transparência.
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Desde que assumiu a presidência do INSS, Gilberto Waller Junior adotou ações para conter fraudes, entre elas a exigência de biometria facial para desbloqueio de benefícios, a suspensão de empréstimos solicitados por representantes legais sem autorização judicial e o descredenciamento de instituições financeiras que descumprirem normas.
O Instituto firmou também acordo com a Secretaria Nacional do Consumidor para monitorar reclamações via plataforma Consumidor.gov.br.
A Febraban declarou desconhecer registros de problemas nas atas do CNPS, mas destacou que desde janeiro de 2020 vigora a Autorregulação do Consignado. Nesse período, 1.962 medidas administrativas foram aplicadas a correspondentes bancários, 113 deles definitivamente impedidos de atuar. Sete agentes de crédito também foram bloqueados, e bancos que não punirem irregularidades podem ser multados entre R$ 45 mil e R$ 1 milhão.
A Operação Sem Desconto, conduzida pela Polícia Federal e pela Controladoria-Geral da União, concentra-se nos descontos associativos, mas apura também fraudes na concessão de empréstimos consignados a aposentados e pensionistas e possíveis vínculos entre as duas práticas.