Brasília — Em setembro de 2025, o governo da Albânia apresentou a avatar de inteligência artificial “Diella” como nova responsável pelas pastas de compras públicas e combate à corrupção. A figura virtual, vestida com trajes tradicionais, discursou no Parlamento albanês e foi saudada pelo primeiro-ministro Edi Rama como “incorruptível”.
A iniciativa, descrita oficialmente como um avanço tecnológico para reforçar a transparência, gerou críticas imediatas da oposição, que contestou o fato de a “ministra” não ser cidadã nem humana. Mesmo assim, o Parlamento confirmou a nomeação, encerrando a cerimônia transmitida ao vivo.
Especialistas ouvidos pelo sociólogo Gabriel Teles, da Universidade de Brasília, alertam que algoritmos podem reproduzir vieses presentes nos dados usados em seu treinamento. Segundo eles, a substituição de agentes políticos por sistemas automatizados tende a deslocar a responsabilidade por eventuais falhas ou irregularidades para equipes técnicas e empresas privadas contratadas pelo governo.
Para esses analistas, transformar um software em autoridade pública cria uma aparência de neutralidade e eficiência, mas esconde decisões tomadas por programadores e fornecedores externos, além de aumentar a dependência do Estado de infraestruturas privadas.
O uso de trajes típicos pela avatar foi interpretado como estratégia de legitimação cultural. De acordo com Teles, a adoção de elementos folclóricos busca conferir empatia ao projeto e reforçar a percepção de modernização do Estado em meio a uma crise de confiança nas instituições políticas.
Imagem: redir.folha.com.br
A nomeação de Diella segue uma tradição histórica, apontam os especialistas, na qual governos recorrem a soluções técnicas para lidar com desafios de legitimidade, apresentando a tecnologia como promessa de “pureza” na gestão pública.
Atendendo a pedido do editor Michael França para que colaboradores da seção Políticas e Justiça indiquem uma canção aos leitores, Gabriel Teles escolheu “Cérebro Eletrônico”, de Gilberto Gil.