Depois de atravessar o pior primeiro semestre em mais de 50 anos, o dólar começa a ganhar terreno e reabre o debate sobre a direção das moedas em 2025.
No início do ano, a divisa americana sofreu forte desvalorização em resposta às tarifas comerciais impostas pelo presidente Donald Trump. O recuo foi tão intenso que, de janeiro a junho, a moeda registrou o pior desempenho semestral desde a década de 1970, segundo analistas de mercado.
A turbulência motivou um salto histórico nos volumes negociados. Levantamento do Banco de Compensações Internacionais (BIS) indica que, em abril — pico da instabilidade —, passaram pelos mercados de câmbio quase US$ 10 trilhões por dia, alta de cerca de 30% em relação ao mesmo mês de 2022.
Desde o fim de abril a moeda vinha sem direção clara, mas, a partir de setembro, iniciou movimento de alta. O Dollar Index (DXY), que compara o dólar a seis divisas fortes, subiu cerca de 3% desde o começo daquele mês.
Para Steve Englander, chefe de pesquisa cambial do Standard Chartered, existe espaço para uma virada mais consistente. Em relatório a clientes, ele afirmou ver “um caminho pelo qual o excepcionalismo do dólar pode ser mantido por meio do rápido crescimento da produtividade e de fortes entradas de capital”. Segundo o especialista, indicadores preliminares sugerem aceleração da produtividade nos Estados Unidos, o que poderia sustentar uma recuperação surpreendente da moeda.
Analistas ressaltam ainda o chamado efeito “camisa menos suja”: apesar dos problemas internos, outras economias apresentam desafios que tornam o dólar relativamente atraente.
— Iene: a moeda japonesa perdeu força após Sanae Takaichi assumir a liderança do Partido Liberal-Democrata, abrindo incertezas sobre a política econômica. O Deutsche Bank, que semanas atrás recomendava compra do iene, abandonou a posição.
— Euro: tensões políticas na França limitaram a valorização da moeda única, mesmo com o suporte implícito do Banco Central Europeu.
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— Libra esterlina: permanece estável à espera do Orçamento britânico previsto para o próximo mês, considerado evento de risco pelos investidores.
O Goldman Sachs observou aumento “desproporcional” nas apostas de alta para o dólar, movimento que contribuiu para levar a divisa ao maior nível em dois meses. A posição está sendo alimentada, principalmente, por vendas no iene e no euro, de acordo com o banco.
A possibilidade de que a inflação estimulada por tarifas volte a ganhar fôlego também pesa nas projeções. Caso os preços subam novamente no fim de 2025 ou no início de 2026, o Federal Reserve pode ter dificuldade para entregar a sequência de cortes de juros esperada por parte do mercado, fator que tende a sustentar o dólar.
Apesar da recente recuperação, a moeda norte-americana ainda acumula queda de 9% em 2025. Se permanecer nesse patamar, anotará a maior desvalorização anual desde 2017. Uma retomada mais forte, porém, poderia levar investidores a ajustar rapidamente suas carteiras, impulsionando novos ganhos.
Analistas lembram que prever câmbio envolve múltiplas variáveis e alto grau de incerteza. Um mercado de trabalho persistentemente frágil nos Estados Unidos, por exemplo, pode conter a valorização. Por ora, a moeda volta a ocupar espaço central nas discussões sobre riscos e oportunidades nos mercados globais.