Ex-diretor da Comissão Europeia diz que França erra ao rejeitar acordo UE-Mercosul

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Paris – O francês Jean-Luc Demarty, 73 anos, ex-diretor-geral de Agricultura (2005-2010) e de Comércio Exterior (2011-2019) da Comissão Europeia, afirmou que a França “está completamente equivocada” ao se posicionar contra a ratificação do tratado de livre-comércio entre União Europeia e Mercosul.

O Parlamento Europeu analisa nesta terça-feira (16) os mecanismos de salvaguarda incluídos no texto – penúltima etapa do processo legislativo do bloco. Dois dias depois, na quinta (18), o tema chega ao Conselho da União Europeia, onde cresce a resistência liderada pelo governo francês.

Quotas já limitam produtos sensíveis

Para Demarty, o principal argumento de Paris – o temor de prejuízos à pecuária, ao açúcar e à avicultura europeias – não se sustenta. Segundo ele, o acordo fixa cotas equivalentes a cerca de 1,5% do consumo do bloco para carne bovina, aves e açúcar, percentual que, em sua avaliação, tende a ter impacto mínimo no mercado interno.

O ex-negociador lembra que o setor agrícola europeu recebe aproximadamente € 40 bilhões por ano em subsídios, valor destinado justamente a compensar diferenças de custo de produção em relação a países terceiros. “A verdadeira proteção já está nas cotas tarifárias”, ressaltou.

Exigências francesas

As chamadas cláusulas espelho, além de novas medidas sanitárias e de salvaguarda – condições fixadas pelo governo Emmanuel Macron para apoiar o tratado – foram classificadas por Demarty como “exageradas”. Ele afirma que todos os produtos importados pela UE já precisam obedecer às normas existentes, com ou sem acordo.

Votação depende da Itália

Demarty avalia que a ratificação exige maioria qualificada (15 dos 27 Estados-membros representando 65% da população). Nesse cenário, a posição italiana tornou-se decisiva: um eventual veto de Roma pode barrar o tratado e, nas palavras do ex-diretor, provocar “catástrofe” para a política comercial europeia.

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Imagem: redir.folha.com.br

Negociações e cronograma

O ex-funcionário da Comissão detalha que as conversas iniciais com o Mercosul ocorreram entre 2003 e 2004, sem avanços significativos. A negociação efetiva, diz ele, só aconteceu de 2016 a 2019, período em que ocupava a Diretoria-Geral de Comércio Exterior. O texto final foi concluído em 2019, congelado durante o governo Jair Bolsonaro e retomado em 2023, após a posse de Luiz Inácio Lula da Silva.

Ganhos econômicos e geopolíticos

Estudos divulgados pela Comissão Europeia indicam expansão de 0,2% a 0,4% no PIB do bloco – entre € 40 bilhões e € 80 bilhões – caso o tratado entre em vigor. Demarty ressalta ainda que, nos últimos 20 anos, a participação europeia no mercado do Mercosul caiu de 35% para 17%, espaço ocupado principalmente pela China. Para ele, a não ratificação empurraria o Brasil para uma dependência ainda maior de Pequim.

Críticas à política francesa

No diagnóstico do ex-negociador, a resistência quase unânime da classe política francesa combina “incompetência” e “covardia”. Ele atribui o posicionamento de deputados e senadores à pressão dos sindicatos agrícolas, que, segundo ele, relacionam de forma equivocada a crise do setor aos tratados de livre-comércio.

Demarty conclui que, se o Mercosul deseja evitar uma “dominação industrial chinesa”, a parceria com a União Europeia é estratégica, e alerta para o custo político de um eventual fracasso na votação desta semana.

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