Dados do Banco Central indicam que, em maio, os lares brasileiros direcionaram 9,86% da renda ao pagamento exclusivo de juros, maior porcentual desde o início da série histórica, em 2005. O resultado supera o pico registrado em 2023, período marcado pelo lançamento do programa Desenrola, voltado à renegociação de dívidas.
Quando se soma amortização e encargos, o comprometimento chega a 27,79% da renda familiar — dos quais mais de um terço corresponde apenas aos juros.
Levantamento do Banco de Compensações Internacionais (BIS) mostra que o peso da dívida em relação à renda nas famílias de 17 países desenvolvidos é, em média, três vezes menor. Nos Estados Unidos, o gasto com dívidas representa 8% do orçamento; no Japão, 7,8%.
Segundo o BC, apenas 2,13% da renda das famílias é usada para quitar financiamentos imobiliários, modalidade com as menores taxas de mercado. O restante — equivalente a 25,66% — está atrelado a linhas mais caras, como cartão de crédito e empréstimo pessoal.
Para Rafael Schiozer, professor de Finanças da FGV-EAESP, o endividamento brasileiro difere do observado no exterior justamente pela maior participação de dívidas de curto prazo, que cobram juros elevados.
Estêvão Kopschitz, economista do Ipea, lembra que, em países desenvolvidos, a maior fatia das dívidas é ligada à habitação, que conta com a garantia do imóvel e juros menores.
Em junho, a taxa média anual do crédito pessoal atingiu 58,3%, maior nível desde maio de 2023. Paralelamente, o saldo de crédito com recursos livres — que exclui financiamento habitacional — avançou 23,4% nos últimos dois anos.
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Fábio Pina, assessor econômico da FecomercioSP, avalia que a expansão do crédito foi favorecida pela melhora do emprego e da renda, fatores que reduziram a percepção de risco por parte das instituições financeiras, mesmo em um cenário de juros elevados.
Após recuar em 2024, o índice de inadimplência superior a 90 dias entre pessoas físicas voltou a subir, chegando a 6,3%, de acordo com o BC. Estudo de Pina aponta que, em 2024, as despesas das famílias com juros avançaram 20,5%, enquanto a massa de renda subiu apenas 3,2%.
Especialistas defendem a expansão de programas de educação financeira, mas reconhecem que isso não basta. Kopschitz ressalta a importância de evitar crédito de curto prazo, e Schiozer reforça que o controle de gastos, compatível com a renda, é decisivo para prevenir o superendividamento.
Um estudo citado por Schiozer, conduzido pelo Banco Central, mostra que o uso do crédito consignado pode levar a redução de consumo no médio prazo, evidenciando os riscos de endividamento elevado.