Secretarias de Fazenda de vários estados intensificaram a fiscalização sobre contribuintes que recorreram ao modelo societário conhecido como “três holdings” ou “três células” para transmitir patrimônio a herdeiros com redução drástica – ou total eliminação – do ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação).
O Rio Grande do Sul lidera a ofensiva. A Sefaz-RS notificou proprietários de estruturas montadas nos últimos anos e estipulou prazo até domingo (31) para o pagamento espontâneo do tributo. Após essa data, haverá autuação com penalidades que podem duplicar o valor devido. A meta do fisco gaúcho é recuperar aproximadamente R$ 5 milhões.
Em São Paulo, auditores também enviam comunicados a adeptos do sistema, considerado, pelos órgãos de controle, forma de planejamento tributário abusivo e potencial crime contra a ordem tributária.
Na estrutura, os pais criam três empresas:
Os bens são aportados na cofre pelo valor de aquisição. Em seguida, as cotas da cofre servem para integralizar capital da veículo, gerando um ágio contábil elevado. Por fim, os pais doam aos filhos as cotas da destino por valor muito inferior ao patrimônio real. Dessa forma, o ITCMD incide sobre montante reduzido, muitas vezes abaixo da faixa de isenção estadual.
Roberto Justo, sócio do Choaib, Paiva e Justo Advogados, vê “falta de substância econômica” na operação. Hygoor Jorge Freire, especialista em gestão patrimonial, classifica o procedimento como simulação e alerta para cursos similares divulgados na internet com nomes como “castelo invisível” ou “AVJ”.
Ex-conselheiro do Carf, Carlos Augusto Daniel Neto afirma que cada ato isoladamente pode ser legal, mas o resultado global configura doação disfarçada: “Essa compra por valor irrisório é uma simulação”.
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Para Natalia Zimmermann, do Velloza Advogados Associados, a estratégia é “temerária” por carecer de justificativa econômica. Michel Siqueira, do Vieira Rezende Advogados, ressalta que a autoridade fiscal pode desconsiderar atos praticados exclusivamente para economizar tributos.
Nas redes sociais, o advogado Marcio Carvalho de Sá, fundador do Time Holding Brasil, defende o arranjo. Segundo ele, o grupo estruturou 1.408 holdings desse tipo nos últimos 12 meses, que somam R$ 12,5 bilhões em patrimônio. O profissional diz ter conhecimento de apenas seis clientes notificados no Rio Grande do Sul e sustenta que não há irregularidade: “Estamos à disposição para prestar informações às autoridades”.
A popularização do esquema por pessoas sem formação jurídica ou contábil levou a OAB a monitorar possíveis casos de exercício ilegal da profissão.
Procurada, a Sefaz-RS afirma que as empresas criadas não apresentam propósito econômico além da transferência de patrimônio “por engenharia societária que artificialmente reduz o valor dos bens”.
Especialistas recomendam que contribuintes revisem os planejamentos e quitem o imposto antes de serem autuados, a fim de evitar multas e procedimentos criminais.