Políticas comerciais variáveis do governo Donald Trump levaram pequenos e médios negócios ao redor do mundo a rever preços, logística e planos de expansão para manter o mercado norte-americano. Seis empreendedores, do Brasil ao Japão, relatam como tentam preservar as vendas mesmo diante de tarifas que chegam a 50%.
A Asket, varejista de roupas sediada em Estocolmo, enviou e-mail a clientes dos Estados Unidos em meados de agosto informando sobre o fim da isenção de minimis — que autorizava a entrada sem impostos de mercadorias de até US$ 800. O aviso provocou corrida às compras e as vendas dobraram em dez dias, segundo o cofundador August Bard Bringeus.
Com o término da isenção e a tarifa de 15% sobre produtos da União Europeia, a empresa manteve os preços, mas viu as margens encolherem. No terceiro trimestre, as vendas caíram 20% ante o ano anterior. “Provavelmente teremos de aumentar preços para recuperar o que estamos perdendo”, afirmou Bard Bringeus.
A fabricante de calçados Maguire, de Montreal, também recorreu a e-mails: primeiro estimulou compras antecipadas; uma semana depois, comunicou acréscimo de US$ 10 a US$ 30 nos preços no Canadá e nos EUA. Sócia-fundadora, Myriam Belzile-Maguire opera duas lojas em solo americano, seu segundo maior mercado, mas suspendeu planos de abrir outras. “Quero aguardar mais estabilidade”, disse.
Tarifa de 50% sobre grãos do Brasil reduziu as vendas externas da São Luiz Estate Coffee, em Carmo do Paranaíba (MG). Com a revogação da taxa, a proprietária Ana Cecilia Velloso avalia voltar a uma feira do setor em San Diego, mas prefere cautela: “Preciso esperar o mercado se estabilizar”.
Nos EUA, Mariana Faerron Gutierrez, da torrefadora Tico Coffee Roasters (Califórnia), pretendia importar os grãos mineiros antes da sobretaxa. Agora corre para retomar o plano, mas mantém um “plano de contingência” caso novas barreiras voltem a ser impostas.
Com tarifa de 15% sobre o chá verde depois do fim do de minimis, Daiki Tanaka abriu uma subsidiária nos EUA para importar e distribuir o matcha produzido em sua fazenda de 4 hectares próxima a Quioto. Clientes americanos são o principal público do negócio batizado d:matcha.
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Nos Estados Unidos, a importadora Mizuba Tea Co., de Portland (Oregon), já gastou mais de US$ 110 mil em tarifas este ano, segundo a fundadora Lauren Purvis. Entre agosto e setembro, cerca de US$ 120 mil em matcha ficaram retidos no Kentucky, e metade dessa carga ainda aguarda liberação.
Diante de regras que mudam “a cada poucos meses”, Víctor Feliu suspendeu os envios da Feliu Chocolate, de Guadalajara, para os EUA no início de setembro. Mesmo sem tarifa sobre suas barras, pacotes foram devolvidos por exigências de rotulagem e documentação. Ele agora orienta clientes americanos a comprar via um varejista no Canadá e congelou planos de vender em lojas físicas nos Estados Unidos.
A Lié Studio, que vende bolsas e joias online, enfrenta cobranças indevidas quando seus produtos, feitos em Portugal, são classificados como originários da China na chegada aos EUA. Segundo a cofundadora Cecilie Moosgaard, taxas podem chegar a 25%. O processo para reaver valores pagos em excesso é demorado, e a empresa elevou preços para consumidores americanos em cerca de 20% desde meados de agosto.
Com margens apertadas, as seis empresas monitoram a agenda comercial de Washington para decidir se absorvem custos, repassam preços ou adiam investimentos — sempre sob o risco de novas mudanças tarifárias.