Os Estados Unidos podem enfrentar uma paralisação parcial do governo a partir da 0h de 30 de setembro, data que encerra o ano fiscal. A possibilidade de um novo “shutdown” surge oito meses após o início do segundo mandato de Donald Trump e ameaça uma economia considerada frágil após a adoção de tarifas globais e ondas de demissões e deportações.
Economia vulnerável
“A atividade está bastante vulnerável”, afirmou Mark Zandi, economista-chefe da Moody’s Analytics. Segundo ele, em um cenário mais resiliente, mesmo uma interrupção prolongada não seria suficiente para derrubar o crescimento, mas na conjuntura atual o impacto pode ser decisivo.
Cada semana de paralisação tende a reduzir cerca de 0,1 ponto percentual do PIB trimestral, estimam analistas. No mandato anterior de Trump, o fechamento de cinco semanas encerrado em janeiro de 2019 retirou 0,1 ponto do PIB no quarto trimestre de 2018 e outros 0,3 ponto no primeiro trimestre de 2019, de acordo com cálculo do Wells Fargo.
Impasses no Congresso
Até esta quarta-feira, democratas e republicanos não tinham retomado negociações. A Câmara, controlada pelos republicanos, aprovou um crédito temporário até novembro, mas a proposta foi barrada pelos democratas no Senado, que defendem a prorrogação de subsídios de saúde prestes a expirar. Trump também se recusou a se reunir com a oposição.
Serviços sob risco
Sem acordo, o financiamento federal expira e serviços considerados não essenciais deixam de funcionar. Experiências anteriores fecharam parques nacionais e museus, suspenderam parte das inspeções de segurança alimentar e interromperam a concessão de empréstimos ou licenças a pequenas empresas. Benefícios como Seguridade Social e Medicare continuam sendo pagos, mas podem ocorrer atrasos em procedimentos administrativos, como a emissão de novos cartões.
Neste ano, o programa Mulheres, Bebês e Crianças (WIC) pode deixar de aceitar novos participantes já em 1º de outubro por falta de verbas. A Casa Branca pediu recursos adicionais ao Congresso, mas não houve deliberação.
Folha de pagamento em espera
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Milhões de servidores civis e militares correm o risco de ficar sem salário enquanto durar o bloqueio orçamentário. A legislação garante pagamento retroativo, mas apenas quando o Congresso aprovar novo orçamento, o que pode levar semanas.
“Não é possível viver indefinidamente de promissórias”, disse Sam Berger, do Center on Budget and Policy Priorities. “Sem renda, famílias deixam de pagar hipoteca e compras básicas.”
Efeitos em cadeia
Ryan Sweet, economista-chefe para os EUA na Oxford Economics, alerta que a queda nos gastos federais costuma atingir em seguida o consumo, os contratos privados e a atividade empresarial. Muitos órgãos ainda não divulgaram planos de contingência atualizados, e alguns retiraram documentos da internet, dificultando a avaliação de danos.
Para Gregory Daco, economista-chefe da EY-Parthenon, o momento é delicado: “Nem todas as paralisações são iguais; com a perda de fôlego da economia, o choque pode ser maior”.
No mercado de títulos, investidores já exigem condições mais favoráveis para adquirir dívida pública, sinal de desconfiança em relação aos rumos fiscal e político. “Um fechamento curto costuma ser tolerado, mas quanto mais tempo durar, maior a preocupação com a capacidade de o governo funcionar”, observou Michael R. Strain, do American Enterprise Institute.
A Casa Branca se recusou a comentar os preparativos para um eventual apagão federal.