O Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmou entendimento de que o herdeiro que detém posse exclusiva de um imóvel deixado em herança tem legitimidade para requerer a usucapião extraordinária em nome próprio, desde que cumpra todos os requisitos legais.
A orientação consta do Informativo 822 da Corte, publicado em agosto de 2024, e consolida decisões recentes sobre o tema. O posicionamento afasta a tese segundo a qual um coherdeiro não poderia usucapir bem que já integra seu patrimônio por direito sucessório.
A modalidade extraordinária exige posse contínua e pacífica por, no mínimo, 15 anos — prazo que pode cair para 10 anos se o possuidor residir no imóvel ou realizar benfeitorias — além de demonstração de comportamento de dono (animus domini) e inexistência de oposição de outros interessados.
Segundo o STJ, “o herdeiro que tem a posse exclusiva do imóvel objeto de herança possui legitimidade e interesse na declaração de usucapião extraordinária em nome próprio”. Na prática, isso significa que a existência de outros herdeiros não impede a aquisição da propriedade por quem permaneceu sozinho no bem.
Especialistas consultados ressaltam que a decisão não cria um direito automático. A abertura do inventário — procedimento que lista bens, direitos e dívidas do falecido — interrompe o prazo da usucapião e, se o herdeiro possuidor for citado, pode inviabilizar a pretensão.
“Quando o inventário transforma o imóvel em patrimônio litigioso, a posse deixa de ser incontestada”, explica a advogada Lara Soares, do escritório Pinho Soares.
O advogado Jaylton Lopes Jr., do Agi, Santa Cruz & Lopes Advocacia, lembra que a usucapião costuma ocorrer em situações em que o proprietário morre, o inventário é postergado e um dos herdeiros permanece no imóvel durante todo o período exigido em lei.
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Casos em que o herdeiro já morava no imóvel antes da morte dos pais, com consentimento destes, não atendem ao requisito do animus domini. “A mera permissão dos proprietários descaracteriza a intenção de dono”, observa Lopes.
Na aquisição por usucapião não incidem ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação) nem ITBI (Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis), por se tratar de forma originária de aquisição. Contudo, propor usucapião para evitar o inventário e economizar tributos configura fraude à lei, alertam os advogados.
Para resguardar o direito dos demais herdeiros e impedir a consolidação da posse exclusiva, além do inventário, são possíveis acordos internos ou ação de arbitramento de aluguel, destinada a fixar valor de uso quando não há consenso entre as partes.
O Informativo do STJ não possui efeito vinculante, mas serve de referência para julgamentos futuros em tribunais de todo o país.