A economia da China vive um momento contraditório: enquanto o setor imobiliário, responsável por cerca de um quarto do Produto Interno Bruto (PIB), atravessa uma crise histórica, áreas ligadas a tecnologia, veículos elétricos e inteligência artificial avançam em ritmo acelerado.
O diagnóstico é de Arthur Carvalho, economista-chefe da gestora TRUXT, que visitou o país entre setembro e outubro. Segundo ele, vendas de terrenos recuaram entre 21% e 24%, sinal de que o mercado de construção passa por uma transformação estrutural, não apenas cíclica. Ao mesmo tempo, investimentos direcionados pelo governo têm deslocado o eixo de crescimento para setores considerados estratégicos.
Carvalho destaca o programa “China 2025”, que prioriza energias renováveis, carros elétricos e IA. Há 18 meses, esses segmentos representavam cerca de 5% do PIB; hoje, respondem por 15% a 20%, de acordo com suas estimativas. “A velocidade é impressionante”, afirma.
Nas grandes cidades, veículos elétricos já dominam as ruas e tornam o trânsito mais silencioso. Robôs e sistemas baseados em IA prestam serviços em restaurantes e pontos de atendimento, criando um ambiente descrito pelo economista como “futurista”.
Empresas como a BYD ilustram a transição da China de fornecedora de baixo custo para criadora de marcas globais. “Ter marcas reconhecidas mundialmente era impensável há cinco ou seis anos; agora é realidade”, observa Carvalho.
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A valorização dessas companhias se reflete no mercado acionário chinês, responsável por algumas das maiores altas internacionais neste ano. A disparada ocorre mesmo com consumo enfraquecido, deflação pelo terceiro ano consecutivo e demanda imobiliária em queda. Para o economista, o movimento pode ter efeito político: elevar o preço das ações ajuda a desviar a atenção da crise imobiliária.
Na corrida global de IA, Pequim adota abordagem centralizada, com forte apoio estatal, em contraste com o modelo norte-americano, que deixa a inovação concentrada em empresas privadas e cobra pelo uso de ferramentas como o ChatGPT. Analistas veem a possibilidade de surgimento de um “campeão” chinês capaz de rivalizar com os Estados Unidos.
Mesmo diante dos desafios no mercado de propriedades, a guinada tecnológica mostra que o governo chinês conseguiu reorganizar parte da base de crescimento, acelerando setores estratégicos e reforçando a presença de grandes fabricantes nacionais no cenário mundial.